09
Febrero
2017
Brasil | Sindicatos | AGRICULTURA

A Previdência Social é nossa!

CONTAG
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Foto: César Ramos

Às vésperas de o Congresso Nacional votar a reforma da Previdência Social através da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287/2016, a CONTAG, mais uma vez, posiciona-se contrária aos termos apresentados pelo Governo de Michel Temer, principalmente quanto à alegação de que os rurais são os culpados pelo “rombo” na Previdência Social e, portanto, deverão contribuir mensalmente e se aposentar com a mesma idade que os urbanos.
A existência de déficit na Previdência Social é contestada pela CONTAG e por diversas organizações renomadas no país, como a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip), o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), e pelas centrais sindicais, por exemplo.

A Previdência Social é vinculada ao Sistema de Seguridade Social (artigos 194 e 195 da Constituição Federal), que é financiado por diversas fontes de contribuição, inclusive sobre a venda da produção agrícola, que dão sustentabilidade a todo o sistema e garante o pagamento dos benefícios.

Portanto, não é correto ter um olhar puramente fiscalista para os números da Previdência Social, que considera apenas a receita proveniente das contribuições previdenciárias sobre folha de salários para pagamento das despesas com benefícios urbanos e rurais.

A Constituição Federal não deixa dúvida de que a Previdência Social está integrada ao Sistema de Seguridade Social, sendo que o correto é contabilizar todas as receitas que financiam o sistema de Seguridade Social para cobrir as despesas com a Previdência, Saúde e Assistência Social.

O próprio texto constitucional especifica as diversas fontes de receitas que financiam todo o sistema. Além da contribuição sobre a folha de salários, há também a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) – que tem a base de cálculo incidindo sobre o faturamento e receita das empresas; a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); a Contribuição sobre Concursos e Prognósticos, entre outras. Fazendo a conta sob essa ótica, a Seguridade Social vem se mostrando superavitária, mesmo em momentos de crise.

Respeito à diferença do trabalho rural e urbano

Outra crítica da CONTAG à proposta diz respeito à elevação da idade de acesso à aposentadoria para 65 anos, equiparando essa idade para homens e mulheres, rurais e urbanos. A entidade entende que essa medida desrespeita as diferenças do trabalho rural, inclusive a expectativa de vida, a idade de ingresso à atividade profissional, a penosidade, o esforço, entre outros aspectos.

Segundo dados divulgados na Nota Técnica nº 25, IPEA, 2016, a partir de estudos feitos por Galiza e Valadares, a grande maioria dos trabalhadores e trabalhadoras rurais começa a trabalhar antes dos 14 anos (78% dos homens e 70% das mulheres).

Essa é uma informação importante para demonstrar que os trabalhadores e as trabalhadoras rurais, pelas regras atuais, já trabalham mais de 40 anos para ter acesso a uma aposentadoria de um salário mínimo.

Outro fator a ser considerado, segundo dados do Anuário Estatístico da Previdência Social, é o fato das trabalhadoras rurais aposentadas estarem recebendo o benefício da aposentadoria por período, em média, de seis anos a menos que as mulheres aposentadas urbanas.

Isso indica que a expectativa de vida das mulheres no campo é inferior à das mulheres urbanas. Todavia, pela PEC 287/2016, o governo quer elevar em 10 anos a idade de aposentadoria para as trabalhadoras rurais se aposentarem com um salário mínimo.

Carência na aposentadoria por idade

A CONTAG, as Federações e Sindicatos entendem que a proposta de aumento no tempo de carência para a aposentadoria por idade de 15 para 25 anos de contribuição é uma exigência cruel para os trabalhadores e as trabalhadoras de um modo geral, especialmente para os que trabalham no campo, cuja maioria jamais conseguirá atingir esse tempo de contribuição ao longo de sua vida laboral, principalmente porque não reúne condições de contribuir mensalmente, já que a renda depende das condições climáticas, o que muitas vezes leva à perda da produção em épocas de seca, enchentes e pragas.

Além disso, no caso dos assalariados e assalariadas rurais, os que conseguem ter um contrato de trabalho formalizado, isso ocorre apenas em períodos sazonais, de no máximo quatro meses durante o ano e em épocas de safras.

Envelhecimento digno e saudável

Nos termos propostos pela PEC 287, os trabalhadores e as trabalhadoras rurais serão obrigados a trabalhar mais de 50 anos para ter acesso a uma aposentadoria por idade no valor de um salário mínimo.

“Somos contra o aumento na idade de aposentadoria porque isso irá exigir desses trabalhadores e trabalhadoras maior tempo de trabalho, em atividade penosa, o que lhes retira o direito a uma aposentadoria digna e os(as) deixa em situação de mais fragilidade.

Também é importante destacar que o trabalho penoso reduz a capacidade de trabalho precocemente e a expectativa de vida. É importante lembrar que a aposentadoria tem feito milagre e a diferença na vida das famílias que vivem no campo e tenho certeza que também na cidade”, destaca a secretária de Terceira Idade da CONTAG, Lucia Moura.

Desenvolvimento rural

A Previdência Social Rural, nas regras atuais, reflete a dinâmica produtiva da agricultura familiar e produz melhorias na qualidade de vida de milhares de famílias no campo.

Além de garantir a subsistência do grupo familiar, as aposentadorias rurais são utilizadas para investimentos na propriedade e contribuem de forma decisiva para a permanência das famílias no campo e para a produção de alimentos que chegam diariamente à mesa dos brasileiros e brasileiras.

A Previdência Rural também cumpre o papel de seguro agrícola em situações de emergência e de calamidade no campo. Portanto, com o benefício da aposentadoria, diminui consideravelmente o êxodo rural, o inchaço nas cidades e mantem o preço dos alimentos dentro do padrão de compra da população.

Mais de 2/3 do valor total dos benefícios rurais são destinados a municípios com até 50 mil habitantes, o que corresponde a um volume de recursos na ordem de R$ 5,6 bilhões/mês que são injetados mensalmente na economia desses pequenos e médios municípios (dados de janeiro de 2016).

Neste sentido, a CONTAG defende a manutenção da regra de participação do(a) segurado(a) especial no custeio da Seguridade Social a partir da incidência de uma alíquota de contribuição aplicada sobre a venda da produção rural.

A PEC 287 propõe mudança nesse ponto, exigindo dos trabalhadores e trabalhadoras rurais uma contribuição individualizada para a Previdência Social.

“Exigir contribuição individualizada e mensal dos agricultores e agricultoras familiares para fins de proteção previdenciária significa excluir milhões desses agricultores do acesso a esse direito e desconstrói o princípio do trabalho em regime de economia familiar praticado pela agricultura familiar.

É um desrespeito! O governo esquece que a renda do agricultor familiar depende das condições climáticas e do resultado da colheita da sua produção, muitas vezes sazonal ou anual, não dispondo de renda mensal para contribuir com o sistema nos termos da proposta apresentada.

E, caso esse ponto seja aprovado, que estímulo a nossa juventude terá para permanecer no campo e fazer a sucessão rural?”, questiona o secretário de Políticas Sociais, José Wilson Gonçalves.

Vinculação ao salário mínimo

A vinculação do Benefício da Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social (BPC/LOAS) ao valor do salário mínimo tem sido uma política estratégica adotada pelo Estado brasileiro nos últimos anos para combater a pobreza extrema e atuar com mais eficácia na distribuição de renda.

A proposta do atual governo de desvincular o benefício do mínimo, conforme previsto na PEC 287, promoverá o efeito inverso do que foi produzido até o momento, aumentando o índice de pobreza e concentrando ainda mais a renda.

Nesse item, ainda, a CONTAG contesta a elevação da idade para acesso ao benefício assistencial, que passa de 65 para 70 anos. “A nova regra vai elevar o nível de pobreza no Brasil, principalmente no meio rural.

Muitos trabalhadores(as) rurais idosos(as), que não conseguiam acessar a aposentadoria devido aos requisitos exigidos, recorriam ao benefício assistencial como forma de garantir a sua subsistência e dignidade na velhice”, justifica José Wilson.

Comissão especial

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou que a Comissão Especial que vai analisar a reforma da Previdência Social será presidida pelo deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ) e o relator será o deputado Arthur Oliveira Maia (PPS-BA). A previsão é que a Comissão comece os trabalhos no início de fevereiro.

Diante de todos esses pontos expostos, a CONTAG, as Federações e Sindicatos avaliam que, se a reforma da Previdência for aprovada nos termos apresentados pelo atual governo, é provável que milhares de agricultores e agricultoras familiares, especialmente os(as) jovens, deixem o campo por falta de perspectiva de acesso à proteção previdenciária. Isso irá intensificar o êxodo rural, bem como impactará na produção de alimentos básicos que garantem a segurança alimentar da nossa população.  

A defesa do MSTTR é pela retirada de todo o capítulo que trata da Previdência Rural, dando oportunidade para abertura de um diálogo e negociação visando analisar as especificidades deste público, que já recebe o mínimo e começa a trabalhar mais cedo e em condições exaustivas e degradantes.

Regras atuais

Trabalhador rural: Aposenta, por idade, aos 60 anos recebendo um salário mínimo. É preciso comprovar 15 anos de atividade rural e contribuir com uma alíquota na venda da sua produção agrícola. Trabalha diariamente, sem acesso a benefícios como FGTS, férias remuneradas e 13º salário, por exemplo. A maioria começa a trabalhar antes dos 14 anos.

Trabalhadora rural: Aposenta, por idade, aos 55 anos recebendo um salário mínimo. É preciso comprovar 15 anos de atividade rural e contribuir com uma alíquota na venda da sua produção agrícola. Trabalha diariamente, sem acesso a benefícios como FGTS, férias remuneradas e 13º salário. A maioria começa a trabalhar antes dos 14 anos e possui expectativa de vida menor que as mulheres urbanas e os homens no geral.