07
Dezembro
2015
Cuestión de modelo
Por Agnese Marra
Foto: riosvivos.org.br
“A mudança climática marca o momento em que o homem não só teme a catástrofe, como também se converte ele próprio em catástrofe”. O tsunami de lama produzido após a ruptura de um dos diques da mineradora Samarco na cidade de Mariana, em Minas Gerais, levou a vida de 13 pessoas e deixou no limbo oito desaparecidos.
“A mudança climática marca o momento em que o homem não só teme a catástrofe, como também se converte ele próprio em catástrofe”. Com essa frase, a jornalista e escritora brasileira Eliane Brum descrevia o momento em que o Brasil se apresentava, na segunda-feira, na Conferência sobre a Mudança Climática (Cop 21) de Paris, “com o currículo manchado pelo maior desastre ambiental de sua história”, conforme afirmava em sua coluna na edição brasileira do jornal El País.
A jornalista se referia ao tsunami de lama ocorrido no dia 5 de novembro, após a ruptura de um dos diques da mineradora Samarco na cidade de Mariana, em Minas Gerais, matando 13 pessoas e deixando 8 desaparecidos. O distrito de Bento Rodrigues, localizado abaixo da represa, foi sepultado em poucos minutos. Não soou nenhum alarme, só os gritos de alguns trabalhadores da mina que saíram correndo para avisar aos vizinhos.
Aproximadamente 62 milhões de metros cúbicos de lama (equivalentes a 20 mil piscinas olímpicas) sepultaram um povoado inteiro, deixando mais de 200 famílias desabrigadas. A avalanche continuou seu curso, invadindo o rio Doce, a quinta maior bacia hidrográfica do país.
Em apenas uma semana, os resíduos minerais desembocaram no oceano Atlântico. “O fluxo de nutrientes de toda a cadeia alimentar na terceira parte da região do sudeste do Brasil e na metade do Atlântico Sul estará comprometido por um mínimo de cem anos”, disse para a BBC o biólogo marinho André Ruschi.
Nos últimos três dias, a superfície coberta de lama se triplicou e se estendeu por mais de 80 quilômetros quadrados, por uma área que era verde e hoje é de um marrom denso e opaco.
De acordo com o professor Marcus Vinicius Polignano, que monitora a atividade econômica e seu impacto ambiental nas bacias hidrográficas da região, 80 por cento do rio Doce estão perdidos. A densidade dos resíduos minerais e a perda de oxigênio da água deixaram 11 toneladas de peixes mortos num rio que em determinadas partes está totalmente seco, obstruído pelo barro.
O pesquisador Carlos Alfredo Joly, do Instituto de Biologia da Universidade de Campinas, assegurava ao jornal Estado de São Paulo que “todo o ecossistema está afetado, não estaremos vivos para ver uma mínima recuperação da vegetação perdida”. Além disso, haverá um “efeito crônico”: quando chover no rio, os resíduos retomarão seu caminho para o mar, e a contaminação da água será intermitente.
As comunidades ribeirinhas foram as primeiras em sofrer este efeito. Meio milhão de habitantes, que viviam na beira do rio, ficou sem água durante 20 dias. Ongs de todo o país enviaram galões para que pudessem sobreviver até encontrarem uma forma de tornar potável a água com lama. Mas, para desespero dos pescadores, que levam uma vida dedicada ao rio, não há fórmula nem resposta que os console.
A jornalista se referia ao tsunami de lama ocorrido no dia 5 de novembro, após a ruptura de um dos diques da mineradora Samarco na cidade de Mariana, em Minas Gerais, matando 13 pessoas e deixando 8 desaparecidos. O distrito de Bento Rodrigues, localizado abaixo da represa, foi sepultado em poucos minutos. Não soou nenhum alarme, só os gritos de alguns trabalhadores da mina que saíram correndo para avisar aos vizinhos.
Aproximadamente 62 milhões de metros cúbicos de lama (equivalentes a 20 mil piscinas olímpicas) sepultaram um povoado inteiro, deixando mais de 200 famílias desabrigadas. A avalanche continuou seu curso, invadindo o rio Doce, a quinta maior bacia hidrográfica do país.
Em apenas uma semana, os resíduos minerais desembocaram no oceano Atlântico. “O fluxo de nutrientes de toda a cadeia alimentar na terceira parte da região do sudeste do Brasil e na metade do Atlântico Sul estará comprometido por um mínimo de cem anos”, disse para a BBC o biólogo marinho André Ruschi.
Nos últimos três dias, a superfície coberta de lama se triplicou e se estendeu por mais de 80 quilômetros quadrados, por uma área que era verde e hoje é de um marrom denso e opaco.
De acordo com o professor Marcus Vinicius Polignano, que monitora a atividade econômica e seu impacto ambiental nas bacias hidrográficas da região, 80 por cento do rio Doce estão perdidos. A densidade dos resíduos minerais e a perda de oxigênio da água deixaram 11 toneladas de peixes mortos num rio que em determinadas partes está totalmente seco, obstruído pelo barro.
O pesquisador Carlos Alfredo Joly, do Instituto de Biologia da Universidade de Campinas, assegurava ao jornal Estado de São Paulo que “todo o ecossistema está afetado, não estaremos vivos para ver uma mínima recuperação da vegetação perdida”. Além disso, haverá um “efeito crônico”: quando chover no rio, os resíduos retomarão seu caminho para o mar, e a contaminação da água será intermitente.
As comunidades ribeirinhas foram as primeiras em sofrer este efeito. Meio milhão de habitantes, que viviam na beira do rio, ficou sem água durante 20 dias. Ongs de todo o país enviaram galões para que pudessem sobreviver até encontrarem uma forma de tornar potável a água com lama. Mas, para desespero dos pescadores, que levam uma vida dedicada ao rio, não há fórmula nem resposta que os console.
Não sei
Também não há resposta para perguntas tão básicas. A mineradora Samarco, propriedade das duas maiores mineradoras do mundo, a brasileira Vale e a anglo-australiana Bhp Billiton, garante não saber a origem do desastre: “Estamos investigando, mas podem demorar de seis meses a um ano até sabermos o que aconteceu”, disse o diretor da Samarco, Ricardo Vescovi.
Ao longo dos dias seguintes, revelou-se a falta de um plano de contingência claro e que a empresa já tinha recebido advertências para elaborar um programa de prevenção de riscos. Tanto a Vale como a Samarco deixavam seus resíduos na represa sem terem obtido a renovação da licença ambiental, uma situação permitida pela legislação do estado se os funcionários não fiscalizassem no devido tempo.
Os dados sobre a capacidade da represa e suas fiscalizações correspondentes não estavam em dia, um problema recorrente em uma região que mantém 42 de seus 735 diques sem garantias de estabilidade e que vive da exploração de minas.
O conteúdo exato dos resíduos minerais na água contaminada foi outra das perguntas sem resposta. Os relatórios elaborados pelas empresas envolvidas no desastre diziam que o “PH da água não havia sido alterado”. A diretora executiva de Saúde da Vale, Vania Somavilla, chegou a dizer que a água da barragem “serviria de adubo para o reflorestamento da região”. Entretanto, o Instituto Mineiro de Gestão de Águas detectou presença de chumbo, arsênico e cádmio, que em princípio não deveriam ser letais para as pessoas.
Coitada da empresa...
A ONU foi muito crítica com a empresa: “É inaceitável que demorem três semanas para divulgarem informações sobre os riscos tóxicos do desastre”, disse o seu representante de Direitos Humanos e Meio Ambiente, John Knox. O responsável pelas Substâncias Perigosas, Baskut Tuncak, definiu as medidas tomadas pelo governo, pela Vale e pela Bhp, como “insuficientes na hora de reagir contra a catástrofe”.
A própria presidenta do Brasil levou uma semana para visitar as vítimas e ver o dano causado. Ainda que, em seu discurso durante a Cop 21, Dilma Rousseff tenha responsabilizado a Samarco pela tragédia, nas últimas três semanas tanto o governo como o estado insistiram na ideia de “evitar buscar culpados”. Inclusive o secretário de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais, Altamir Roso, qualificou a Samarco como “mais uma vítima do desastre”.
O Instituto Brasileiro de Meio Ambiente impôs à mineradora uma multa de 250 milhões de reais, e o Ministério Público Federal pediu à Samarco um total de 20 bilhões de reais para restaurar o rio e indenizar as vítimas. Mas, em um país como o Brasil, onde só 3 por cento das empresas pagam suas multas ambientais, a esperança de receber estes recursos é escassa.
A multinacional Vale que, em 2012, recebeu da Greenpeace o título de “pior empresa do mundo”, por “não respeitar os direitos humanos e ambientais”, é também líder em evasão de impostos no Brasil, com uma dívida de 41 bilhões de reais. Mas a Vale é uma das principais doadoras nas campanhas eleitorais. O jornalista Alceu Castilho, no portal Outras Palavras, conta como o PMDB (partido aliado do governo e majoritário no Congresso) é o principal receptor de ajuda da Vale, com um total de 23,35 milhões de reais em 2014.
A transnacional controla o setor da mineração no Brasil com o ministro de Minas e Energia à frente. O PT é o segundo maior receptor de doações da mineradora, com 8,25 milhões de reais, seguido pelo PSDB (partido da oposição, presidido por Aécio Neves), com 6,96 milhões.
Com estes dados sobre a mesa, entende-se melhor que, apesar de estar vivendo o maior desastre ambiental do país, com centenas de famílias sem casas, sem trabalho e com o ecossistema de uma região dinamitado, os partidos políticos não tenham o interesse por buscar culpados, mas que estejam dispostos a aprovar projeto de lei promovido pelo PMDB que flexibiliza ainda mais as licenças ambientais para as grandes empresas.
Durante a Cop 21, Dilma Rousseff garantiu que lutaria para recuperar o rio Doce, mas não falou em mudar o modelo desenvolvimentista onde, em áreas de “interesse nacional”, vale tudo.
O jornal digital francês Mediapart lembrou nesta semana o que aconteceu em Mariana e denunciou como o papel das multinacionais não estava no programa da conferência do clima em Paris: “Entretanto, são elas as grandes contaminadoras do planeta”, dizia a publicação.
Para o jornalista brasileiro e defensor dos direitos humanos, Leonardo Sakamoto, a única opção é “acabar com o modelo de crescimento da ditadura, que apesar de algumas mudanças aqui e ali, continua sendo mantido, inclusive por pessoas que a ditadura torturou”.