02
Outubro
2014

Brasil, mais exploração e mais trabalho escravo?

Empresas pressionam para ampliar terceirizações

En Buenos Aires, Gerardo Iglesias
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Economista e pesquisadora do Centro de Estudos sobre Sindicalismo e Trabalho da área de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), assessora sindical e coordenadora do Fórum Nacional em Defesa dos Trabalhadores Terceirizados, Marilane Teixeira conversou com A Rel sobre um perigo que paira sobre as costas dos trabalhadores brasileiros: a possibilidade de uma generalização das terceirizações.

-Qual é a principal função do Fórum?
-Foi criado em 2011, com a participação de todas as centrais sindicais, da academia, da Associação Nacional de Magistrados e da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho.
Sua principal função e realizar ações para enfrentar um projeto de lei, o PL 4330, atualmente em estudo no parlamento, prevendo a ampliação das terceirizações para todos os setores da economia.

-Isto terminaria com qualquer tentativa de se chegar ao trabalho decente no Brasil...
-Exatamente. Se o PL 4330 for aprovado, o que haverá serão empresas apenas com o nome fantasia, porque ficará permitida a terceirização de qualquer tipo de atividade, em qualquer área.

-Considerando que no Brasil a maioria dos trabalhadores resgatados de condições de trabalho análogas à escravidão faz parte de empresas que terceirizam serviços, se este projeto de lei chegar a ser aprovado, qual seria o novo cenário?
-Segundo um recente estudo realizado por um pesquisador da Unicamp e auditor fiscal do Trabalho, oito de cada dez trabalhadores resgatados de condições análogas à escravidão proveem de empresas prestadoras de serviços.

A isto temos que incluir o fato de várias empresas estarem fazendo lobby para o projeto ser aprovado.

Um caso particular aconteceu em uma empresa do setor de celulose, CENIBRA, que foi condenada a pagar uma vultosa multa por práticas ilegais de terceirização.  A empresa entrou com uma apelação no Supremo Tribunal Federal (STF) com o argumento de que a terceirização não pode estar limitada às atividades de apoio ou de intermediação, mas também deve estender-se às atividades finais da empresa.

Se este texto for aprovado, o cenário pode ser devastador.

-O que o Fórum fará neste contexto?
-O Fórum se reuniu recentemente e ali foi definida uma série de estratégias de trabalho para serem instrumentalizadas nos próximos dias. Entre elas está a promoção de uma audiência pública no STF sobre o pedido da CENIBRA, a elaboração um documento que apresente as possíveis consequências que o PL4330 pode provocar, e sua apresentação aos diversos candidatos à Presidência do país, entre outras coisas..

Nós nos reunimos uma vez por mês e certamente a nova instância ocorrerá depois do primeiro turno das eleições nacionais, em outubro..

Dualidade do governo central
Juiz e júri

O empresariado quer que a PL 4330 seja aprovada o quanto antes pelo parlamento e para isso fazem muita pressão. Contra isto, estamos organizando seminários informativos e convocando audiências públicas nos diferentes estados brasileiros.

-Há um posicionamento do governo sobre este assunto?
-A posição do governo é muito dual, já que o próprio Estado terceiriza muitas atividades.

Por exemplo, na PETROBRAS, empresa estatal de economia mista, por cada trabalhador com carteira assinada, cinco são terceirizados.

Uma parte do governo defende uma regularização do trabalho terceirizado, mas outra diz que não é possível limitar a terceirização.

A Presidência, por sua vez, assinala que é importante haver um consenso entre trabalhadores e empresários, e passa a bola para os dois lados. Infelizmente, esta situação já se esgotou no ano passado, quando foi constituída uma comissão quadripartite que se reuniu durante dois meses, mas que não chegou a nenhum acordo.

Um empresariado recalcitrante
Rejeita as exigências mínimas dos trabalhadores

Para nós existem cinco condições fundamentais para regularizar a terceirização: que seja aplicada às atividades intermediárias, mas não na atividade final de uma determinada empresa; que quem terceirizar assuma solidariamente a responsabilidade pelo que acontecer com a empresa terceirizada; que os trabalhadores sejam incluídos na convenção coletiva do setor de atividade econômica a que pertençam; que seja garantida equidade de direitos nos locais de trabalho e que seja garantida também a saúde e a segurança desses trabalhadores.

Os empresários rejeitaram todas estas condições.

Acidentes e LER
O Brasil na retaguarda mundial

-Outra questão muito preocupante é que o Brasil ocupa os primeiros lugares em acidentes de trabalho no mundo.
-Avançou-se muito em vários aspectos de formalização, mas em termos das condições do trabalho e dos acidentes de trabalho a situação vem piorando.

As estatísticas são preocupantes, porque persistem não só os acidentes mas também as doenças do trabalho, vinculadas ao ritmo frenético da indústria. As pequenas empresas também terceirizam a mão-de-obra. 

A motivação para a terceirização – além da questão econômica, que é a principal – é que o empresário pretende transferir passivos no que se refere à saúde e à segurança do trabalhador.

É muito mais fácil contratar uma empresa prestadora de serviços, porque transfiro a ela toda a responsabilidade para com a saúde desses trabalhadores.

Portanto, a conjuntura é complexa, mas lutaremos com garra.

-Contem com o total apoio de nossa Internacional.
-E vamos precisar, sem dúvida alguma.



Tradução de Luciana Gaffrée

Publicado por Darío Falero