Com Dolores Ayas
“Estamos destruídas; continuamos trabalhando graças aos remédios”
Trabalha em um hotel 4 estrelas, de uma grande rede espanhola de hotéis, onde é delegada sindical pelas Comissões Obreiras. Falamos com ela sobre suas condições de trabalho e as de suas companheiras.
-A carga de trabalho das camareiras é em geral bastante pesada. Como é no seu caso?
-Nós fazemos 20 quartos por dia, e limpamos também as áreas nobres. Antes fazíamos 22 quartos, mas com a minha luta, conseguimos fazer 20, que para mim ainda continuam parecendo muito, um exagero.
-Por que é tão esgotante?
-Por várias coisas, mas o pior é mover as camas de madeira, são muito pesadas. São 50 camas por dia. E os colchões pesam também como um morto, é horroroso. Há dias em que não posso com minha alma. Porque, além de mover as camas, temos que levantar os colchões e prender os lençóis.
Antes as camas tinham rodinhas, eram empurradas e pronto. Mas agora são camas normais. E não consigo movê-las. Sou incapaz de arrastar essas camas do corredor até o quarto ou tirá-las dali, porque simplesmente não posso levantar um peso muito maior que o meu.
-E quantas camareiras há no hotel?
-No hotel somos umas 14 camareiras, contando com a governanta. Oito somos contratadas fixas e as restantes são contratadas eventuais. E para elas a situação é muito difícil, porque além da pressão que sentem por poderem ser mandadas embora a qualquer momento, muitas das novas não são capazes de fazer o trabalho andar, porque é duríssimo. E não é que sejam preguiçosas, é que é muito difícil..
-Porque, além disso, o ritmo de trabalho é muito intenso, não é?
-É, e como a temporada é mais curta, também há mais problemas. Antes, o hotel ficava fechado por 40 dias e durante o resto do ano permanecia aberto. Sempre havia alguma ocupação. Então, havia épocas com menos quartos ocupados, e dava tempo para fazer a limpeza mais a fundo.
Mas, agora não abrem o hotel até terem a certeza de que estará lotado, e se mantém assim em toda a temporada. Então, o trabalho sempre é enorme e não é possível fazer as coisas como Deus manda, porque nunca há tempo. Nunca se pode fazer o trabalho em condições que não sejam de muito estresse.
-E se os turistas ficam menos dias no destino, também repercute na carga horária de trabalho de vocês…
-Sim, porque se tenho cinco quartos de turistas desocupados em um dia, me sobra menos tempo para os outros quartos, onde só posso fazer o imprescindível e, mesmo assim, tento fazer o melhor. Isso é um estresse enorme. Ao final, quem dá a cara somos nós, porque o cliente deve pensar: “Que camareira mais desleixada”. Eu fico muito irritada que as coisas não sejam feitas como se deve.
-Sempre foi intenso assim o trabalho nos hotéis de Maiorca?
-Quando começamos, o trabalho era mais leve. Não nos exigiam tanto esforço. Eu lembro que fazia o trabalho em boas condições.
Mas, agora os ritmos aumentaram. Os empresários cada vez querem mais. Fixam uma meta de dinheiro anual, e quando seus lucros ficam abaixo dessa meta veem como prejuízo. Eu vejo os hotéis cheios, mas eles sempre dizem que há prejuízo; sempre querem um pouco mais e já perceberam que podem conseguir. Nós só somos números e eles não se importam conosco.
-Como você dizia, isto deve provocar uma situação de estresse muito forte.
-Exatamente. Não é apenas o volume muito grande de trabalho, mas também o estresse, porque percebemos que não conseguimos fazer tudo, que por mais que nos esforcemos, não conseguimos.
Aqui trabalhamos por oito horas correndo, desde que entramos até que saímos. E eu já não tenho idade para correr tanto. Depois, quando chegamos em casa, já não podemos fazer nada. Toda a energia que tenho foi consumida no trabalho, não me sobrando nada para depois.
-Este ambiente de trabalho está certamente afetando muito a sua saúde.
-Eu estou destruída, como a maioria das trabalhadoras. Tenho a coluna péssima, fui operada do túnel do carpo, tenho as mãos destroçadas... estou como todas as outras, convenhamos, não sou mais do que um espelho de todas.
Estamos destruídas, e trabalhamos todos os dias graças aos remédios. Estamos todas drogadas, não com drogas ilegais, são legais. Eu tomo remédios para reumatismo, anti-inflamatórios e também para o coração, porque trabalho muito estressada.
-O que vocês conquistaram como Sindicato?
-Consegui que nos diminuíssem dois quartos diários, porque quando renovaram o hotel, há um ano e meio, pedi uma reavaliação da carga de trabalho das camareiras, com o apoio do Sindicato. Havia mudado todo o sistema do hotel, mas não queriam uma reavaliação das tarefas.
Entao, a opção que eu tinha foi a de lhes dizer que ou faziam a reavaliação ou eu os denunciaria à Inspeção do Trabalho. Finalmente, eles nos retiraram dois quartos.
Mas, o mais triste é que as pessoas estão tão assustadas que quase me mordem. Já chegaram a me dizer que se fazíamos 22 porque agora temos que fazer 20 quartos? E eu fico louca com isso. Outro problema é o ataque de minhas companheiras, porque estão com medo, porque temem que, se reivindicarmos nossos direitos, sejam mandadas embora.
-Certamente é um contexto muito difícil para o trabalho sindical.
-Ser sindicalista hoje é muito complicado. Há dois ou três anos houve uma campanha para jogar os sindicatos no chão.
É horrível. E o medo calou os próprios trabalhadores.
Em Palma de Mallorca, Ernest Cañada
Fotos: Ernest Cañada/Rel-UITA