25
Junho
2015

“A NR36 deve ser a Bíblia dos trabalhadores do setor frigorífico!”

En Serafina Correa, Gerardo Iglesias
20150625-Geni714
Presidenta do Sindicato da Alimentação e Afins de Serafina Corrêa, no sul do Brasil, e integrante da direção da Confederação Nacional Democrática dos Trabalhadores da Alimentação (CONTAC), Geni dalla Rosa foi fundamental na criação da norma reguladora 36 para o setor frigorífico, aprovada em 2013. A Rel conversou com ela sobre os avanços na sua implementação e com relação aos desafios apresentados neste estágio, entre outras questões.
-Qual é a sua avaliação sobre a aplicação da NR36? Houve progressos?
-Houve, mas ainda não podemos festejar. Comemoramos quando foi aprovada, porque foram 15 anos de luta para conseguir esta Norma Reguladora para o setor, mas passado esse primeiro momento, temos agora a árdua tarefa de implementá-la.

Como a sua aplicação se dá por etapas, as empresas têm prazos para adequar o ambiente de trabalho. E ainda falta muito, entre outras coisas porque em alguns casos se requer investimentos milionários.

Com relação ao que eu chamo de o coração da NR36, isto é, as pausas, por serem elas em longo prazo o que evitará as Lesões por Esforços Repetitivos (LER), já estão sendo aplicadas em muitos frigoríficos do país.

-Parece com o sistema de pausas...
-A Norma estipula 10 minutos de descanso a cada 50 de trabalho, o que representa um total de 6 pausas por dia.

Neste ponto, a NR36 está funcionando muito bem. Dos restantes itens, todos eles muito importantes para a saúde e a segurança dos trabalhadores, ainda falta adaptar alguns.

No caso das empresas pequenas, onde tudo é mais demorado devido aos custos de investimento necessários para adequar o ambiente de trabalho às disposições desta norma, os sindicatos já vêm trabalhando e exigindo das empresas que realizem estas mudanças o mais rápido possível.

O exemplo de Serafina Corrêa
Grandes avanços
-Qual é a experiência em sua região?
-Aqui, desde que começaram a implementar a NR36, especialmente as pausas durante o trabalho, o número de trabalhadores que procuram o Sindicato por problemas de saúde, devido a causas geradas pelo trabalho, diminuiu sensivelmente.

Lembro-me de que, antes desta norma, os trabalhadores se aproximavam da organização sindical em busca de uma solução para as dores sentidas devido ao ritmo intenso e aos movimentos repetitivos.  

Nesta época, não havia uma solução tangível. Os trabalhadores eram encaminhados ao médico, mas ao voltarem ao trabalho tudo se repetia. Era um círculo vicioso que sempre preocupou muito os dirigentes sindicais.

Hoje eu posso dizer que não aparecem novos casos, os que existem são aqueles que já existiam e são crônicos.

-Você sempre diz que a NR36 não é um fim em si mesmo, e sim uma ferramenta para dignificar o trabalho nos frigoríficos.
-Assim entendemos. Para que o ritmo frenético nas unidades frigoríficas diminua e os trabalhadores/as não vejam a sua saúde afetada, há que implementar a norma em todas as unidades de produção do país.

Para isso é necessário que os trabalhadores se empoderem da NR36, que a conheçam em profundidade, que a promovam e a defendam. A NR36 tem 216 subitens, são muitos pontos que precisam ser supervisionados.

Coloco como exemplo o caso das cadeiras. A norma diz que deve haver pelo menos três cadeiras para cada quatro trabalhadores no ambiente de trabalho. Mas, se a Comissão designada pelo Sindicato não estiver informada disso, será muito difícil que possa fazer a reclamação aos gerentes do frigorífico.

Por esta razão é que a CONTAC tem realizado seminários para que os trabalhadores/as dos frigoríficos – principalmente os dirigentes sindicais – conheçam o conteúdo da NR36, por ser extremamente necessário na hora de defender os direitos de todos os companheiros do setor.

Quem tem o poder de reclamar e de denunciar qualquer tipo de irregularidade que afete a saúde e a segurança dos trabalhadores são os dirigentes sindicais.

Portanto, um sindicato forte é fundamental para fazer com que a normativa seja estabelecida plenamente.

A cartilha da NR36 tem que ser a bíblia dos trabalhadores do setor.

-O fato de a maioria dos trabalhadores nos frigoríficos avícolas serem mulheres tem que ver com o sucesso da aplicação da NR36 em Serafina Corrêa?
-Com certeza! E isto se deve também a um longo trabalho desenvolvido junto às trabalhadoras de base juntamente com a nossa federação, com a CONTAC, e com a Rel-UITA.

Foram organizados vários seminários com estas companheiras e a NR36 faz parte da vida de nossos trabalhadores e trabalhadoras.

Foram distribuídas milhares de cartilhas com a NR36, com o objetivo de que todos os trabalhadores que atuam no setor saibam que coisas devem exigir de seus empregadores para preservarem a sua saúde.

Os trabalhadores devem ser fiscais
Nunca confiar nos empresários quando
se trata de aplicação da norma
-A questão da saúde dos trabalhadores é, fundamentalmente, uma questão política...
-Sempre foi. Quando começamos a discutir a redação desta norma, esteve sempre presente a questão de contratar mais médicos. Mas, o que fariam estes profissionais senão dar mais analgésicos para a dor?

Lembro-me de que um dos grandes frigoríficos do país chegou a ser conhecido pelos trabalhadores como “Doutor Diclofenac”, porque essa era a solução oferecida para a enorme fila de funcionários que, devido ao ritmo frenético e repetitivo imposto pelas máquinas frigoríficas e pela falta de pausas durante o trabalho, terminavam com graves problemas nos braços, na coluna e nas mãos. 

Nossa preocupação sempre foi a prevenção.

A tarefa dos dirigentes sindicais e dos próprios trabalhadores é contínua, diária, porque se nos descuidarmos aí estarão os empresários para levar vantagem, para não realizar pausas, porque uma máquina quebrou, para aumentar a velocidade das máquinas porque houve atraso na produção... O empregador sempre buscará uma forma de sair ganhando, isto é uma questão política.

E outra coisa que devemos destacar é que, a partir da NR36, surgiram outros problemas a se atacar e prevenir nos frigoríficos, como é o uso de determinada máquina, dos detectores de níveis de amônia, a umidade do ambiente, os sistemas de refrigeração com amônia.

Estamos nesta etapa. A Contac realizará nos dias 1 e 2 de julho, em Florianópolis, um seminário sobre o funcionamento dos aparelhos utilizados para medir o nível de amônia, a umidade do ambiente, o ruído, etc. Comprará alguns destes medidores, e os técnicos especializados ensinarão aos delegados sindicais como funcionam.

Eles serão, então, os responsáveis por realizar a fiscalização.

No dia 22 de julho, haverá no Paraná outro seminário que abordará a questão da manutenção preventiva da amônia nos sistemas de refrigeração.

E estaremos trabalhando regionalmente, divulgando a NR36 nos países do Mercosul por meio da UITA.

20150625-Geni714-1

Fotos: Gerardo Iglesias